sábado, 31 de agosto de 2024

O perigo da moderna técnica - dom Samuel OSB

 

O PERIGO DA MODERNA TÉCNICA

Marshall McLuhan, il profeta del “villaggio globale”

 

“MCLUHAN E OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO EXTENSÃO DO HOMEM.”

 

Considerado ainda em vida o “filósofo da era eletrônica”, Herbert Marshall Mcluhan, ex-professor de literatura inglesa no Canadá, professor de diversas universidades americanas e cuja indiscutível autoridade em matéria de comunicação de massa acabou por impor-se, anteviu com notável clarividência o que hoje todos nós estamos vendo, e praza ao bom Deus, que com olhos bem abertos!

Em sua obra magna sobre o assunto – “Os meios de comunicação como extensão do homem” – de caráter  revolucionário e desmistificador, mostrou Mcluhan de que modo  os “meios de comunicação de massa afetam profundamente a vida física e mental do ser humano, levando-o do mundo linear e mecânico da primeira revolução industrial para o novo mundo audiotátil da era eletrônica”, projetado precisamente para manter-nos dentro dele o máximo de tempo possível, como numa espécie de gaiola invisível onde voluntariamente nos encerramos.

 Como se tivesse sido uma espécie de profeta laico do tempo em que viveu,  o pensamento de Mcluhan voltou-se para um fenômeno insólito de vastas proporções, o qual, apenas nascido, começou a invadir e minar subitamente a vida dos seres humanos, sem que muitos se apercebessem das bruscas mudanças que em si mesmos estavam sendo operadas pelo advento dos modernos meios de comunicação de massa.

O que nos dias que correm  vêm  suscitando os mais calorosos debates e as mais acesas polêmicas de todo tipo é esta grande característica distintiva do momento histórico-cultural hodierno: a existência indubitável de uma “complexíssima rede de comunicações em que está imerso o homem na era da eletrônica, da cibernética, da automoção, e que afetam profundamente sua visão e sua experiência do mundo, de si mesmo e dos outros”, mas cujos meandros sombrios e engrenagens manipuladoras os simples usuários não percebem.  Eis o ponto crucial sobre o qual convém e muito que reflitamos.

Corria o ano de 1957 quando James Reston escreveu no The New York Times o seguinte: “Um diretor da saúde pública notificou esta semana que um ratinho que, presumivelmente andara assistindo televisão, atacou uma menina e seu gato, já adulto. Ambos, gato e rato, sobreviveram, e o incidente fica registrado como lembrete de que as coisas parecem estar mudando.”

Totalmente desnecessário dizer que ninguém escapa da mudança, elemento constitutivo da existência humana. A mudança, porém,  que se tem visto na presente época,  não é nem esta mudança inevitável a que todos sem exceção estamos sujeitos, na qualidade de seres imersos no espaço e no tempo, nem tampouco aquele tipo de mudança que cada um, livremente e sem ser coagido por nada nem por ninguém, decide impor a si mesmo e ao curso de sua vida, no uso radical de sua liberdade. Quanto a primeira mudança, é inerente a vida, e quanto a esta outra, é obra nossa.

A mudança para a qual Macluhan quis que olhássemos e sobre ela refletíssemos seriamente é uma mudança que por assim dizer tem sido imposta sem que nós mesmos sejamos os responsáveis diretos por ela e esta não pode deixar de nos preocupar.

É fato que gigantescas transformações micro e macro econômicas, sociais e políticas vem ocorrendo no mundo inteiro de longa data, e é de se crer que continuem acontecendo, porque nem o tempo e nem a vida ficam estacionados em estado de inércia absoluta e imutável.

O que tem preocupado o ser humano que pensa nas radicais transformações operadas pela tecnologia na face do globo, e consequentemente na vida dos seres humanos, é que estas mudanças tem afetado nosso comportamento, nossas emoções, nosso cérebro, nosso sono, nosso cotidiano, em suma, o curso habitual de  nossa vida como um todo.

Não podemos deixar de nos perguntar o que nós estamos fazendo com a tecnologia, em que e para que a estamos empregando e o que ela(a Tecnologia) está fazendo conosco. Foi para alertar a humanidade, que Nicholas Carr, leitor voraz dos grandes clássicos da literatura universal mas  cuja capacidade de leitura e de concentração foi seriamente comprometida por acessos compulsivos,  escreveu “A geração superficial: o que a Internet está fazendo com os nossos cérebros.”

Escreveu Mcluhan em seu livro que o general David Sarnoff teria dito que “estamos sempre inclinados a transformar o instrumento técnico em bode expiatório dos pecados praticados por aqueles que os manejam. Os produtos da ciência moderna, em si mesmos, não são bons nem maus: é o modo com que são empregados que determinam o seu valor.” E Mcluhan acrescenta com finíssima ironia: “Aqui temos a voz do sonambulismo em nossos dias.”

A única coisa de que o ilustre militar parece ter-se esquecido e na qual provavelmente não cogitou é que devido a propensão humana para o que é mau e ruim costumamos fazer mau uso até de coisas boas, ou daquelas que são moralmente neutras. Se sempre e apenas o animal humano fizesse bom uso do que em si – a técnica, por exemplo não é nem boa e nem má – não haveria qualquer problema, mas não é isso o que a experiência vulgar nos ensina fartamente.

Enganar-se-ia quem ingenuamente supusesse que a tecnologia, nos moldes em que hodiernamente se apresenta, foi inventada com fins altruístas e elevados, ou para tornar mais cômoda e prazerosa a vida dos seres humanos por pessoas realmente interessadas em aumentar a um nível nunca dantes atingido na história de nossa raça o bem estar coletivo da família humana. Os inventores das engenhocas destruidoras de tempo e de saúde psíquica que usamos regularmente para isso e aquilo em nossa faina cotidiana(não podemos deixar de reverenciar a sua genialidade inconteste) não estavam por certo preocupados em criar um mundo melhor que este em que temos tido de viver.

Terá sido sem razão que alguns se disseram arrependidos de suas criações, cujos futuros efeitos não foram capazes de prever, e hoje não façam uso do que eles mesmos criaram?

“Temo o dia em que a tecnologia se sobreponha à humanidade. Então o mundo terá uma geração de idiotas. O mundo é um lugar perigoso para se viver.” (Albert Einstein, ganhador do prêmio Nobel de Física)

 

 

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