UM SANTO AINDA NÃO CANONIZADO
Dom Samuel Dantas, OSB
Dificilmente
encontrar-se-à na vetusta história da Igreja uma personagem em torno de cuja
vida e obra tenham se erguido as mais acesas polêmicas, as mais acaloradas
discussões e debates, como a figura do celebérrimo padre Cícero Romão Batista.
Amado e venerado por uns,
odiado e caluniado por outros, Padre Cícero impôs-se a ricos e pobres, a nobres
e plebeus, a intelectuais e indoutos, tendo sido em vida o que se poderia sem nenhuma hipérbole qualificar de um
fenômeno religioso e miraculoso da mais alta envergadura.
Anualmente, acorrem a
interiorana Juazeiro, no sul do Ceará, milhões de peregrinos, cuja devoção ao
padre Cícero é deveras impressionante. Milagres sem conta continuam a ser
atribuídos a seu poderoso valimento junto a Deus.
Como é possível que não
seja santo um homem que costumava percorrer léguas unicamente para administrar os
sacramentos a moribundos desolados? Como é possível que não seja santo um homem
cuja palavra pacificadora foi capaz de por termo a sangrentas rixas familiares?
Como é possível que não seja santo um homem que, tendo tido todo o Nordeste aos
seus pés, jamais utilizou o seu prestígio para beneficiar-se? Como é possível
que não seja santo aquele sacerdote que, tendo recebido polpudos donativos de
seus devotos admiradores, viveu pobremente,
legando tudo que tinha a Igreja, a cujas ordens sempre se manteve
obediente? Como é possível que não seja santo um homem que, a semelhança de
Cristo, soube amar e perdoar os fariseus invejosos que converteram sua vida em
um pungentíssimo calvário?
Os inimigos do padre Cícero acusam-no de embuste
e de ter se envolvido na política. Quanto a primeira acusação, nada há de mais
pífio: somente um sacerdote néscio – e padre Cícero não o era – tentaria forjar
um prodígio. Ademais, não podia ele ignorar a reservada circunspecção com a
qual a Igreja costumava tratar alardeados portentos, tidos por sobrenaturais.
Quanto a seu envolvimento
na política, deve-se observar que em virtude da complexa conjuntura de então,
foi necessário que o padre Cícero nela tomasse parte. Era a única maneira de
por termo a facções rivais que sanguinolentamente se digladiavam. Sabe Deus que
a razão pela qual padre Cícero ingressou no âmbito da política foi totalmente
diversa da razão pela qual o fazem muitos hodiernamente.
De minha parte, julgo que
a prova inconteste da santidade de padre Cícero é o próprio Juazeiro. Ai, vê-se
a piedade sincera, a oração constante, a procura de Deus, a humildade posta em
prática, o amor a Deus e ao próximo traduzido em obras, a expansão de uma
devoção que não cessa de crescer. Juazeiro é como um vasto santuário ao qual se
dirigem os que tem fome e sede de Deus.
Diziam os antigos que não
existe juiz mais justo e reto do que o tempo. Este, sepulta as mediocridades
invejosas, e enaltece os que em vida se distinguiram.
Não tenho a menor dúvida
de que este justíssimo juiz, mais cedo ou mais tarde, justiçara aquele que,
quanto mais o tempo passa, tanto mais se agiganta aos olhos da posteridade,
enquanto que, todos os que intentaram debalde prejudicá-lo, jazem sepultos para
sempre no olvido – termo natural para o qual sempre se dirige a maioria dos
homens.
Aliás, como prova da
implacável justiça do tempo, tenha-se em vista que os caluniadores e
hostilizadores acérrimos do nosso padim são recordados tão somente pelo
lamentável fato de o terem sido!
colaborador : Dom Samuel Dantas, OSB
Dom Samuel(Émerson Dantas de Araújo), é natural de Mauriti- Ce. Monge professo solene de votos perpétuos do Mosteiro de São Bento da Bahia, Salvador. É licenciado em Filosofia e Bacharelado em Teologia pela antiga faculdade de São Bento da Bahia e mestre em Filosofia pela UFBA(universidade Federal da Bahia)
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