(Entrevista concedida a Armando Lopes Rafael)
Madre Maria Aparecida Menezes do Couto, da Ordem de São Bento (OSB), atual Prioresa do Mosteiro de Nossa Senhora da Vitória, de Juazeiro do Norte, disse que muita gente ainda não entendeu a mudança da denominação de “Mosteiro” para “Abadia”. Perguntam: O que mudou? O Mosteiro vai deixar de ser Mosteiro?, etc. Para falar sobre o assunto, Madre Maria Aparecida concedeu a entrevista abaixo.
Pergunta: O que é necessário para a criação de um mosteiro beneditino?
Madre Maria Aparecida – Quando um Bispo deseja a fundação de um Mosteiro de monjas beneditinas, faz o pedido a uma Abadia já existente. O novo Mosteiro se torna um Priorado Simples, dependente do Mosteiro fundador. Quando atinge o número de oito monjas de votos perpétuos, torna-se um Priorado Conventual, independente, e a Prioresa Conventual assume o governo do Mosteiro com os mesmos deveres de uma Abadessa, somente não usa a cruz peitoral e não recebe a Bênção Abacial. Em cada Visita Canônica que ocorre de três em três anos, o Abade Presidente, junto com a comunidade do mesmo Priorado, examinará as possibilidades de sua elevação à categoria de Abadia.
E quando um Mosteiro pode ser elevado à Abadia, como aconteceu recentemente com o de Juazeiro do Norte?
Madre Maria Aparecida – Quando atinge o número de 12 monjas de votos perpétuos o Abade Presidente, em Visita Canônica ao Mosteiro, constatando que a comunidade caminha bem e existem condições para isso, pede que essa comunidade faça um Capítulo Conventual para decidir – por votação –, se quer ou não que o Mosteiro seja elevado à categoria de Abadia. O Bispo Diocesano também expressa seu desejo. O Abade Presidente encaminha a Ata Capitular e a carta do Bispo à Sé Apostólica, pedindo a ereção do Mosteiro em Abadia. A Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica examina cuidadosamente a questão e tendo em conta o parecer favorável do Abade Presidente da Congregação Beneditina do Brasil, através de um Decreto cria o Mosteiro como Abadia. Foi o que aconteceu conosco.
Como foi esse processo?
Madre Maria Aparecida – Em fevereiro de 2013 tivemos a Visita Canônica. Nosso Abade Presidente, Dom Emanuel d´Able do Amaral, acompanhado da Abadessa Co-Visitadora Madre Martha Lúcia Ribeiro Teixeira, mostraram-se muito contentes com o enraizamento e a irradiação do Mosteiro em Juazeiro do Norte, e constatando que a comunidade caminha bem, nos pediram que realizássemos um Capítulo deliberativo no qual antes da votação todas pudessem manifestar a sua opinião quanto a oportunidade da elevação do nosso Mosteiro à categoria de Abadia. Nosso Bispo Dom Fernando Panico, que já havia manifestado também o desejo de que essa elevação acontecesse no Ano Centenário da Diocese de Crato, escreveu uma carta muito bonita ao Papa Francisco. Encaminhamos tudo ao Abade Presidente, que é quem deve enviar a documentação ao Vaticano. E no dia 11 de dezembro do ano passado foi aprovado e enviado o Decreto criando nosso Mosteiro como Abadia. Mas somente no dia 09 de fevereiro chegou às mãos do Abade Presidente esse Decreto. Comunicamos esse fato a Dom Fernando dia 10, quando veio celebrar conosco a festa de Santa Escolástica, irmã de São Bento.
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Quem foi Santa Escolástica?
Madre Maria Aparecida– O que sabemos sobre Santa Escolástica está no Livro II dos Diálogos, do Papa São Gregório Magno, monge beneditino. A iconografia medieval apresenta Santa Escolástica com um báculo, como Abadessa, mas na realidade ela era irmã de São Bento, consagrada a Deus, e que ia uma vez por ano encontrar-se com o irmão numa dependência do Mosteiro e passavam o dia em santos colóquios e louvores a Deus. No último encontro, ela pediu ao irmão para passarem a noite toda conversando sobre as alegrias da vida celeste. São Bento negou, pois não podia passar a noite fora do Mosteiro. Narra São Gregório que o céu estava sereno, sem nuvens. Diante da recusa do irmão ela cruzou as mãos sobre a mesa e nelas inclinou a cabeça para rogar a Deus todo- poderoso. Logo que levantou a cabeça, tão violentos trovões e relâmpagos e tão copiosa chuva explodira que nem São Bento, nem os irmãos que com ele vieram puderam mover o pé do recinto em que estavam. E assim passaram a noite toda em santas conversas sobre a vida espiritual. Ela pôde mais porque amou mais, escreve São Gregório Magno. Três dias depois, São Bento em oração viu a alma da irmã em forma de pomba penetrar nas profundezas do céu. Santa Escolástica era discípula de São Bento e é esse o significado de seu nome: Escolástica. Ela não foi a fundadora do 1º mosteiro beneditino feminino do mundo ocidental, como foi anunciado.
Quais os passos a partir de agora para oficializar a nova Abadia de Juazeiro do Norte?
Madre Maria Aparecida – No dia 18 de março faremos a eleição da 1ª Abadessa do Mosteiro de Nossa Senhora da Vitória. Qualquer Irmã que tenha a idade e o tempo mínimo de Profissão Perpétua exigidos pode ser eleita.
Após a eleição, a eleita recebe a cruz peitoral e marca-se a Bênção Abacial, que é uma cerimônia muito bela. A data foi marcada para o dia 24 de junho, Solenidade de São João Batista e 9º aniversário da inauguração do nosso Mosteiro. Nossa vinda para Juazeiro do Norte corresponde a um plano misterioso de Deus, pois o que Dom Fernando disse na homilia do dia 10 de fevereiro último, está confirmado em um livro que é do conhecimento de poucos, sobre a vinda de uma fundação de monges a pedido de Pe. Cícero, que encontrou uma afinidade muito grande com a espiritualidade de São Bento. Padre Cícero formou o povo de Juazeiro do Norte na oração e no trabalho, que é o lema da Ordem de São Bento: Ora et Labora. Os monges saíram do Mosteiro de Olinda em direção a Juazeiro do Norte e vinham acompanhados pelo Superior maior, na época o Abade de Olinda, Dom Gerardo Van Caloen. Na Serra do Estevão, em Quixadá, ele caiu do cavalo e interpretou como um sinal de que Deus queria que a fundação do novo mosteiro fosse ali, no município de Quixadá. E assim foi fundado o 1º Mosteiro Beneditino do Ceará, o Mosteiro da Santa Cruz. Esse mosteiro não foi adiante, sobretudo pela dificuldade da água.
E somente depois de muito tempo a Ordem de São Bento veio para o Cariri?
Madre Maria Aparecida – Sim, as monjas vieram em 2003 trazendo para Juazeiro do Norte o Ora et Labora de São Bento. Já na visita de sondagem que fizemos, para ver se seria possível atender o convite de Dom Fernando, ou seja, a transferência de São Cristóvão, em Sergipe, para Juazeiro do Norte, sentimos uma grande afinidade com esse povo. É bom lembrar que em 15 de junho de 2001, quando ainda não tinha assumido sua nova diocese em Crato, Dom Fernando, em visita ao Mosteiro de Nossa Senhora da Vitória em São Cristóvão nos disse: “Vou tomar posse na Diocese de Crato no dia 29 de junho. Se não ficarem aqui, lembrem-se de mim que quero muito um Mosteiro beneditino na minha Diocese". Não podemos deixar de ver aí o dedinho do Padre Cícero. Viemos numa aventura de fé, sentindo que havia um plano de Deus a nos chamar para Juazeiro do Norte. Aqui chegamos no dia 13 de maio de 2003 e ficamos dois anos numa chácara no Bairro Aeroporto, que generosamente nos foi cedida por Rosenir Fiúza, diretora do Colégio Paraíso, Não podemos deixar de mencionar o Pe. José Alves de Oliveira, hoje Monsenhor e pároco emérito da Paróquia do Menino Jesus de Praga, que desde o início nos acompanhou e até agora nos acompanha com carinho de um verdadeiro pai.
Não houve dúvidas de que Juazeiro do Norte era o lugar indicado para o novo Mosteiro?
Madre Maria Aparecida – Quando tomaram conhecimento de nossa decisão de sair de São Cristóvão ouvimos muita coisa negativa, como: “que vão fazer naquele sertão? Vão passar fome...Vão trocar o certo pelo duvidoso”, etc. Com nossa vinda, agora olham para Juazeiro do Norte com admiração. Eu costumo dizer que nosso Mosteiro é um dos milagres de Juazeiro do Norte, pois o prédio com a hospedaria, o dormitório das monjas (que chamamos celas) e as oficinas ( onde ganhamos o nosso pão de cada dia) foi construído em um ano e cinco meses com a ajuda da França, Holanda, e Alemanha, pela construtora Cecé Coelho sendo engenheiros Dr. Tadeu e Dra. Fátima que deram o melhor de si nessa construção. Em 24 de junho de 2005 nosso Mosteiro foi inaugurado. Quando escolhemos esse terreno, que foi doado pela Prefeitura na gestão de Dr. Carlos Cruz só havia mato, hoje estamos cercadas de casas, num bairro próspero. Foi preciso nos lançarmos em mais essa aventura de fé: a construção de nossa igreja, pois o número de fiéis que vinham participar de nossas missas dominicais aumentava sempre mais.Dra. Maria Lília Campelo, a arquiteta que projetou o prédio do Mosteiro,nos presenteou com o belo projeto da igreja que está sendo construída pela Construtora Sólida, sendo engenheiro o Dr. Paulo de Souza, que a vem construindo com muita dedicação e competência. Por um misterioso desígnio de Deus, ela que tanto desejava ver concluída a igreja faleceu dia 06 passado. Pela dedicação e competência do nosso engenheiro a igreja já estaria pronta. Falta pouco, mas estamos a espera de que a Providência Divina nos envie os recursos para completarmos a construção. Desejamos muito que na nossa igreja seja realizada a bênção da primeira Abadessa da primeira Abadia do Ceará, que o Senhor, em seu misterioso desígnio, quis que fosse na Diocese de Crato – no Ano Centenário da Diocese – e na cidade de Juazeiro do Norte, cidade da fé que atrai uma multidão de romeiros do Pe. Cícero, para consolar o coração tão sofrido do nosso caro Pastor. E na paróquia do Menino Jesus de Praga, onde nosso caro Mons. José Alves, pároco na nossa chegada, agora emérito, que com seus paroquianos, assumiu nossa comunidade com carinho de pai . Gostaria de terminar com uma reflexão do nosso atual pároco Pe. Lenilson, na homilia que fez na Missa que celebrou hoje no Mosteiro. “A elevação desse mosteiro a abadia foi um sinal de deus, uma resposta de Deus nesse momento difícil que nossa diocese está atravessando. É como Deus nos dizendo: Eu estou com vocês. Não fiquem presos às pequenas coisas”. O Senhor nos pede algo grandioso. Pensemos alto, pois nascemos para o alto.
Carta do Bispo D. Fernando pedindo a Abadia
Carta do Bispo D. Fernando pedindo a Abadia
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