domingo, 8 de maio de 2011

AOS AMIGOS DE MONS. MURILO



Já escrevi alguma coisa sobre Mons. Murilo, do muito que até poderia ter feito. Privei de sua amizade, e isto era apenas um grande privilégio meu, como outros, vários, que tinham motivos e razões para serem considerados muito mais importantes e dedicados. Por isso mesmo, desde a escolha que fiz como meu confessor, embora não muito regular, procurei não exorbitar nem me exibir como tal. Mas, no íntimo, eu estava convicto que poderia, ao ensejo da minha própria fragilidade humana, olhá-lo nos olhos para dizer-lhe do Deus e do diabo que há dentro de mim, na certeza de que ele me entenderia, e por sobre a revelação, ele, com generosidade e misericórdia, imporia sobre mim suas mãos, com a graça de Deus, o que me confortaria, devoto de pouca fé, no caminho, pela missão. Enfim, era apenas um grande privilégio meu. Verdade é que este relacionamento sempre me trouxe o encantamento de ter próximo um irmão em Cristo, fraterno e conselheiro, com quem abri o coração, poucas, mas relevantes vezes, por quase 40 anos. A tragédia dos últimos dias – a que o levou de volta ao Pai me comoveu ao modo como foram aquelas perdas já experimentadas, de parentes próximos, com lágrimas que foram para a conta da resignação, na crença que nos ensinara, pelo Ressuscitado. Enfim, até posso dizer, sem vangloriar-me, que ser seu amigo era expressão que ganhara o público, sem aviltar o privado de nossa conversa, frequentemente aos sábados, de onde se falava de tudo, sem sinais de leviandade. Na sua ausência, destes anos mais recentes, esta nomenclatura – “os amigos de Mons. Murilo” ganhou, em certas ocasiões e circunstâncias, o imperativo de algo que me tem incomodado profundamente.
 Relevo, por exemplo: Quando recentemente, alguma imprensa fez uma série de provocações tentando revelar bastidores das relações Vigário-Diocesano, para enfim, concluir sobre os traumatismos das alterações provocadas no âmbito da Paróquia-Matriz houve quem, com muita propriedade, argüisse a necessidade de que se revelassem “os amigos de Mons. Murilo”, informantes quase desqualificados – pensei comigo. Tratava-se, neste caso, de revelações de fontes privilegiadas sobre conversas reservadas que teriam acontecido, ao sabor das quais, algumas confidências se firmaram para garantir que o Bispo Diocesano desencadeara um processo de gradual substituição da presença do quase “vigário-colado” em troca dos interesses que moviam a propalada ganância da diocese para com as finanças paroquianas. Afinal, sendo a mais importante, terminava sendo a maior contribuinte do erário diocesano. Necessário é que se diga que Mons. Murilo não era um rebelde, um osso duro no caminho de quem quer que fosse. Foram muitas as vezes em que, ao pragmatismo realista de orçamentos, de débitos intransferíveis e pela sustentabilidade, ele foi o homem sensível e cordato às transferências suplementares em socorro, até mesmo a questões pontuais e de demanda financeira na Diocese. Longe disto, portanto, o atalho fácil de usá-lo como a pedra do caminho. Onde estavam os “amigos de Mons. Murilo” que não lhe ouviam falar dessa intempestiva saciedade que não protelava mais as sucessões no Socorro, na missa do dia 20, nas romarias, enfim, na paróquia? O que sabemos, e depreendemos, certamente também por inferência, se dirá de uma relação cordial, fraterna, amiga, entusiasmada, partilhada nos mesmos altares das devoções da imensa Nação Romeira. Era inútil incendiar uma conjuntura apressada, litigiosa. Divergências, havia. Mas, nada que comprometessem a sintonia em projetos que procuravam recuperar espaços e tempos perdidos, dos tempos de outros pastores. Nada de ranço. A doença, desgraçadamente, antecedera em muito este clima decantado por desavisados, apressados em justificar a animosidade fantasiosa. Por isso mesmo, muitos não contribuímos. Não falamos, nem estrebuchamos. Terá sido isto algo que nos diz o quanto ainda somos mesquinhos e medíocres? Omissos diante do vilipêndio subreptício que procuraram propalar?
 Outro exemplo flagrante que surge por estes dias tem sido a questão das terras no Sítio Porteiras. Novamente se reclama do silêncio e a omissão (?) dos “amigos de Mons. Murilo”, diante de uma certa lama que resvalou para cima de sua memória por eventual atecnia do processo de compra e venda, como foi denunciado, levando a Diocese a promover questão judicial pró anulação do ato. Os que conheceram Mons. Murilo, nem precisariam ser seus amigos íntimos para identificar-lhe como pessoa que tinha traços marcantes de respeito à hierarquia – seus superiores, a dispositivos constitucionais – as normas da cidadania, “a regras, tratados, filósofos e sábios”. Sua postura de religioso diocesano e de cidadão cumpridor de obrigações, não admitiria a insinuação horrorosa de haver perpetrado a leviana e não autorizada alienação do bem, sem o devido respaldo, reclamado principalmente pelo seu respeito ao patrimônio de sua Igreja e ao povo que o legara. “Os amigos de Mons. Murilo”, por minha percepção, somente, não aceitam a vergonhosa imputação de que praticou desonestidade por negociar sem autonomia, maquiar valores de dinheiros e por desviá-los fraudulentamente, sabe-se lá para onde, porque não dizem. Aí, mais importante é a versão, não o fato em si, à luz de documentos com fé de ofício e boa fé do promitente vendedor. Parece-me que este é o foco da questão: “...o Monsenhor é honrado e não se trata de atingir a sua memória, a sua dignidade, mas se acredita que os documentos fornecidos são aparentemente insuficientes e tecnicamente mal elaborados, o que contribuiria para abrigar e proteger uma tramóia que se perpetuou por anos, até que a especulação imobiliária fizesse crescer o suspeitoso baixo valor do acerto, ao tempo, à exorbitância do mercado aquecido de hoje. E nisto foi o coitado do Monsenhor ludibriado na sua boa fé.” Enquanto isto ganha, quase, até à folha policial dos noticiários, continuamos em clima de terror, onde as perguntas que mesmo feitas publicamente não são respondidas por quem as pode fazê-lo: 1. É, ou não é, verdade que os Diocesanos anteriores diriam sempre que Mons. Murilo nada fazia em sua paróquia sem a consulta prévia ao seu bispo? (Observo que como tal, dois deles ainda são o testemunho vivo de que, consultados, autorizaram e sabiam de tudo. Contrariamente a isto, Monsenhor é morto e sepulto, não pode se defender e tem ainda uma porção de “amigos” omissos – gente que fica caladinha e não diz uma palavra.); 2. O valor acertado por Mons. Murilo e o adquirente, e pago em conformidade, era justo? (Não seria possível restabelecer esta verdade, reconstituindo os valores históricos do bem, com uma estimativa sensata, antes mesmo de se usar valores posteriores, especialmente os da avaliação do erário municipal e outros que dizem estar hoje oscilando entre 18 e 20 milhões?); 3. Recebidos os valores, nas prestações pactuadas, qual foi o destino que Mons. Murilo deu a esta soma? (Seremos, ou não, tão mais ingênuos quanto alimentarmos a ficção com maliciosos devaneios, se não cobrarmos, imediatamente, a transparência de assentamentos e registros de valores em livros de contabilidade paroquial e diocesana, ao acréscimo de atas de conselho presbiteral e livros de tombo?).
 Além destas, outras questões poderão ser suscitadas, especialmente para a elucidação do negócio. Lamentavelmente, o que se percebe no ar é que pouco interessa a figura de Mons. Murilo. É como se ele fosse o marginal da história. Algo descartável que, diante dos interesses recíprocos e litigantes, não deve ter conseqüências maiores, entre perder e não levar prejuízos aos seus clientes. Da parte da Diocese, certamente, não houve seriedade em expor o fiel servo ao ridículo. A cena esdrúxula da coletiva era o canto antecipado do enredo temerário, movido a circunstante serviço bem engendrado por banca advocatícia que deve ter ouvido falar, vagamente, de quem se tratava. Contudo, do ponto de vista da legitimidade da operação, como se verificou, mesmo ao caso da aparente extemporaneidade do uso da procuração e outros detalhes, melhor mesmo é quedar silencioso. Para isto, a via judicial já foi acionada e o processo deve correr ao sabor de pareceres, julgamentos e eventuais liminares tão comuns ao andamento da burocracia e do ritual das câmaras e tribunais. Preocupa-me, tão somente, o esclarecimento sobre a parte que esteve sob a decisão e operação de Diocesanos e Pároco. Restabelecidas estas verdades, talvez Mons. Murilo venha a ficar em paz, a mesma paz que conduz seus amigos aos atos sinceros de uma devoção que nasceu e cresceu em torno deste homem iluminado.
Tão pouco tempo tivemos para recolher a lágrima...
Tão pouco tempo tiveram para enxovalhar-lhe a alma...    

Fortaleza, 06.05.2011
Renato Casimiro   

2 comentários:

Mauricio Xavier disse...

Renato - Muito bom o seu escrito sobre o Mons. Murilo. Aos poucos a verdade vai aparecendo. Sempre tomei partido a favor dele, desde o primeiro instante.

Jesus de Miúdo. disse...

Difícil encontra no profícuo espaço da Internet bons diários. Belíssimo blog. Passo a segui-lo.

(Jesus de Miúdo)
www.acaridoemuamor.nafoto.net