No Brasil, cerca de 400 mil quebradeiras de coco vivem do extrativismo do babaçu. De olho na agregação de valor, tecnologias simples e de fácil manuseio já permitem dobrar a renda de 200 famílias com o aproveitamento total do coco da palmeira. Considerada a mais rica palmeira utilizada na indústria extrativista brasileira, o babaçu serve de fonte de renda para pelo menos 400 mil quebradeiras de coco no Brasil, segundo estimativas do Ministério do Meio Ambiente. Da folha da palmeira, que pode chegar a 20 metros de altura, pode se fazer telhado para as casas e artesanato; do caule, adubo e estrutura de construções; da casca do coco, carvão para alimentar as caldeiras da indústria; do mesocarpo, a multimistura usada na nutrição infantil; da amêndoa pode obter-se ainda o óleo, empregado na alimentação e na produção de combustível, lubrificante e até mesmo sabão.
De olho neste potencial, ainda pouco aproveitado pelas quebradeiras de coco espalhadas pelos 18,5 milhões de hectares de babaçuais na faixa de transição para a floresta amazônica, principalmente no Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins, a Fundação Mussambê sediada em Juazeiro do Norte desenvolveu a Tecnologia Social “Aproveitamento Total do Coco Babaçu”. Com maquinário simples e de fácil manuseio, a iniciativa resultou no desenvolvimento da Máquina Despeliculadora para facilitar a retirada da amêndoa e o aproveitamento de dois subprodutos: o mesocarpo (rico em amido, cálcio, fósforo e ferro) e o endocarpo (rico em fibras). Também foram criadas a Máquina Rotativa de Corte de Coco Babaçu e a Prensa Hidráulica para extração do óleo da amêndoa, com capacidade de 150 litros de óleo.
“Até então as tecnologias disponíveis para a quebra não iam muito além do machado. O mais importante é que estas novas máquinas não eliminam empregos. Pelo contrário, geram novos postos de trabalho diante do aproveitamento de todos os sub-produtos”, diz o presidente da Fundação Mussambê, Daniel Walker Junior.
A idéia original do engenheiro Gilberto Batista, criador das tecnologias, era facilitar o corte do coco, antes feito pelas quebradeiras com um machado e um cassetete de madeira. Com a máquina, a produção passa de mil cocos por dia para 30 mil. As máquinas já beneficiam 200 trabalhadoras no Ceará e no Maranhão. Este ano, começam a ser implementadas no Maranhão, em parceria com o governo do estado, mais 160 agroindústrias, envolvendo, cada uma, 30 famílias no processo.
O que está em jogo, segundo Walker, é uma alteração profunda no aproveitamento do babaçu. No processo tradicional de extração do óleo - de fundo de quintal - o coco ainda é quebrado na pedra, basicamente por mulheres e crianças. Cada trabalhadora extrai de um milheiro de cocos cerca de 13 kg de amêndoa por dia, com grande desperdício e fartas histórias de acidentes de trabalho. Na etapa seguinte, as amêndoas são trituradas em um pilão, num processo lento e exaustivo. Neste sistema, 52 quilos de amêndoas rendem aproximadamente 15 litros de óleo e o que sobra é vendido como combustível, a preço baixo, para as indústrias locais de cimento, cerâmicas e padarias por meio de atravessadores.
Fundação Mussambê explica aproveitamento do coco babaçu na Mostra de Tecnologias Sustentáveis do Instituto Ethos, em São Paulo: ampliação de parcerias
Com a despeliculadeira e o extrator manual de óleo, uma prensa hidráulica chega a extrair até 100 litros em oito horas de trabalho, ao passo que no processo convencional a produção atinge cerca de 20 litros de óleo em uma semana. Além de aumentar a produção, a máquina permite também o aproveitamento do resíduo do processo de prensagem, que vira uma torta rica em proteínas para ração animal, principalmente de ovinos, caprinos e suínos. O custo do kit com todo o maquinário, segundo Gilberto, está hoje em torno de R$ 25 mil, sendo que o investimento pode ser recuperado em até três meses dependendo da produção. “Com as máquinas é possível trabalhar com 30 milheiros por dia. Para cada um, são R$ 60 de faturamento e R$ 20 de gasto, o que dá cerca de R$ 1.200 por dia”, diz.
A Associação dos Moradores dos Sítios Correntinho, Cruzinha, Saguim, Carrapicho e Coruja, no município de Barbalha (CE) foi pioneira na adoção dessa tecnologia, em outubro de 2003. Nesta época, cada família não conseguia fazer mais de R$ 200 por mês. Com a adoção das novas práticas, o valor subiu para R$ 450. “Mas esse valor ainda é pouco e foi prejudicado pelo excesso de chuvas este ano. Nossa projeção é de uma renda mensal segura em torno de R$ 600”, diz Walker. O quilo da amêndoa, que era vendido por R$ 0,80, hoje não é vendido por menos que R$ 1,30. “Mas a vantagem não é só o aumento do preço da amêndoa. Os subprodutos já são todos aproveitados e vendidos”, diz Walker.
A experiência contemplou, inicialmente, a instalação da prensa manual para extração de óleo de babaçu, com capacidade de 50 litros de óleo/dia. Em 2005, foi implantada uma nova unidade de extração de óleos vegetais, no Distrito Campo Alegre, município de Crato. Nessa etapa, foram viabilizados novos incrementos à tecnologia anterior, que permitem, além de maior aproveitamento do babaçu, uma produtividade equivalente a 100%. “Queremos agora criar entrepostos para ganhar escala e força na negociação, eliminando os atravessadores. Este será certamente um dos nossos novos desafios”, diz Walker.
Por Vinícius Carvalho, jornalista do Portal da Rede de Tecnologia Social. Para mais informações visite: www.rts.org.br
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